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Marca Bahia Notícias

Notícia

A entrega de Heleno

Por Marília Moreira

A entrega de Heleno
Para qualquer não iniciado na história do futebol, é fácil exclamar que nunca havia ouvido falar de Heleno, jogador conhecido não só pelo futebol, mas pelas polêmicas atuações fora de campo nos idos dos anos 40. A recém-lançada cinebiografia “Heleno – O Príncipe Maldito”, dirigida por José Henrique Fonseca, fala tanto para os aficionados em futebol, quanto para estes que nada entendem ou lembram do esporte. Afinal, como o próprio diretor afirmou, “o filme não é sobre futebol”, mas é um filme que mostra a conturbada e breve vida de um craque brasileiro e retrata não só sua relação com o futebol, como também com a sífilis – e a falta de tratamento que o leva à loucura –, com as mulheres, com os vícios e, acima de tudo, que mostra o destempero que regia todas essas relações.  Daí o estranhamento ao ver muitos críticos de cinema afirmarem ser este um ponto fraco do filme. O filme é um drama pessoal. E ponto. Todos os elementos são indispensáveis para compor a personalidade do “gênio-problema” e todos são muito bem trabalhados, sem cair no maniqueísmo ou no preconceito. É fato, no entanto, que quem vai ao cinema sem nada saber da história do craque dentro de campo – Heleno passou pelo Botafogo, Vasco, Boca Juniors, América – sai sem saber maiores detalhes sobre os feitos que o tornaram craque.
 
Formado em Direito e oriundo de família rica, Heleno nunca exerceu a profissão de advogado e sempre teve como paixão maior o futebol. Em 1937, foi revelado pelo Botafogo – seu time de coração – e fez uma impressionante marca de 204 gols em 233 partidas, durante os dez anos em que ficou no time, coisa, inclusive, que não ficamos sabendo no filme. Foi devido às brigas com os colegas de camisa que Heleno foi vendido ao Boca Juniors e teve de viajar para a Argentina, abandonado sua mulher, grávida de seu primeiro filho. Depois, o craque – já transtornado pelo avanço da doença e pela separação – ainda passou pelo Vasco, onde foi campeão carioca de 1949, pelo Atlético Junior de Barranquilla, da Colômbia (em Barranquilla, encontra-se uma estátua em sua homenagem, "El Jogador"), pelo Santos e pelo América, do Rio de Janeiro, onde encerrou a carreira e disputou uma só partida, a única também que jogou no Maracanã. Até mesmo o Nobel de Literatura Gabriel García Marquez escreveu, em 1951, sobre o jogador quando este estava no Barranquilla. Na nota, García Marquez comenta sobre o retorno de Heleno aos gramados e o quão diferente o craque se mostrava.
 
A bela fotografia é responsabilidade do premiado Walter Carvalho. A aposta no preto e branco é um tanto arriscada para o cinema nacional, mas não decepciona. O filme ganha pontos também por sua narrativa não-linear e a montagem que justapõe os momentos de arrogante glória aos momentos de fragilidade vividos no sanatório em Barbacena. Fragilidade reforçada não só pela montagem paralela, mas pela própria preparação do ator: Rodrigo Santoro emagreceu cerca de 12 quilos para viver a fase final do personagem – parte da perda de peso se deu pelo próprio ritmo de filmagens - e treinou com o ex-jogador Cláudio Adão para entrar na pele de Heleno. Muito do personagem foi obtido durante cinco anos de pesquisa. Assim como Heleno se entregou obsessivamente às paixões que teve na vida, Santoro – mesmo confirmando as diferenças de personalidade - mostrou, mais uma vez, que é todo entrega. Basta lembrar os papéis vividos por ele em “Abril Despedaçado”, “O Bicho de Sete Cabeças” ou “Carandiru” e ir conferir o mais novo longa protagonizado pelo ator.