Senado vai debater PL que atualiza lei do impeachment e impõe prazo para presidente da Câmara decidir sobre pedidos
Por Edu Mota, de Brasília
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado vai realizar nesta quarta-feira (06) uma audiência pública para debater o projeto de lei 1.388/2023, que sugere um novo rito para os processos de impeachment contra autoridades da República. O projeto, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é resultado de propostas apresentadas por uma comissão de juristas instalada no ano passado.
A comissão de juristas foi presidida pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski. Ao final dos trabalhos, foi redigida a proposta de nova legislação para substituir a Lei 1.079, de 1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o processo de julgamento.
O projeto estabelece, por exemplo, um prazo para que o presidente da Câmara dos Deputados decida se aceita a denúncia por crime de responsabilidade contra o presidente da República. De acordo com o texto do projeto, a denúncia contra um presidente será apreciada preliminarmente pelo Presidente da Câmara dos Deputados no prazo de até 30 dias úteis.
A nova legislação afirma que na apreciação da denúncia, cabe ao presidente da Câmara dois caminhos de decisão: o arquivamento liminar da denúncia, por não preencher os requisitos jurídico-formais; ou a submissão da denúncia à deliberação da Mesa. No caso do silêncio do presidente da Câmara após finalizado o prazo legal, será considerado o indeferimento tácito, com o consequente arquivamento da denúncia.
Outra novidade do projeto é a possibilidade de denúncia de crime de responsabilidade por partidos políticos, sindicatos e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O PL 1.388/2023 também mantém a possibilidade de o cidadão poder oferecer denúncia contra as autoridades.
A atual Lei de Crimes de Responsabilidade permite que qualquer cidadão denuncie o presidente da República ou um ministro de estado por crime de responsabilidade na Câmara dos Deputados. Basta que o cidadão assine a denúncia com firma reconhecida e apresente documentos que comprovem a acusação. O PL 1.388/2023 afirma que o pedido deve preencher os requisitos da iniciativa legislativa popular. No âmbito federal, a Constituição exige a assinatura de um por cento dos eleitores, distribuídos por pelo menos cinco estados da Federação. Em cada um deles, é preciso no mínimo três décimos dos eleitores.
Um outro ponto do projeto é a ampliação do rol de autoridades sujeitas a processos de impeachment. Além do presidente e do vice-presidente da República, podem ser denunciados por crime de responsabilidade:
- ministros e comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica;
- ministros do STF;
- membros dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público;
- procurador-Geral da República;
- advogado-geral da União;
- ministros de tribunais superiores;
- ministros do Tribunal de Contas da União (TCU);
- governadores e vice-governadores;
- secretários de estados e do Distrito Federal;
- juízes e desembargadores;
- juízes e membros de tribunais militares e tribunais regionais Federais, Eleitorais e do Trabalho;
- membros dos tribunais de contas de estados, Distrito Federal e municípios; e
- membros do Ministério Público da União, dos estados e do Distrito Federal.
O projeto tipifica uma série de novos crimes de responsabilidade cometidos por autoridades do Estado. No caso do presidente da República, eles são divididos em cinco grandes áreas. Uma das novidades é a seção exclusiva para crimes contra as instituições democráticas, a segurança interna do pai?s e o livre exerci?cio dos poderes constitucionais.
Entre esses crimes estão: usar de violência ou grave ameaça contra seus membros ou ainda violar as imunidades e prerrogativas que lhes são asseguradas pela Constituição; divulgar, direta ou indiretamente, por qualquer meio, fatos sabidamente inverídicos, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas; atentar, por meio de violência ou grave ameaça, contra os poderes constituídos; decretar estado de defesa, estado de sítio, ou a intervenção federal, ou empregar as Forças Armadas em operação de garantia da lei e da ordem, sem a observância dos requisitos constitucionais e legais; praticar quaisquer dos crimes contra o Estado Democrático de Direito, definidos na legislação penal; constituir, organizar, integrar, manter, financiar ou fazer apologia de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; fomentar a insubordinação das Forças Armadas ou dos órgãos de segurança pública.
O texto elaborado pela comissão de juristas também tipifica crimes cometidos por magistrados e comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Entre os militares, passa a ser crime expressar-se por qualquer meio de comunicação a respeito de assuntos político-partidários, incitar ou participar de greve ou motim e realizar ou permitir atividades de inteligência com desvio de finalidade.
No caso dos magistrados, a regra vale para ministros do STF, dos tribunais superiores e do TCU, além de juízes e desembargadores e membros dos tribunais de contas de estados, Distrito Federal e municípios. Entre outras condutas, é considerado crime:
- participar de julgamento sabendo estar impedido;
- exercer atividade ou manifestar opinião político-partidária;
- manifestar opinião sobre processos ou procedimentos pendentes de julgamento;
- receber auxílios ou contribuições de pessoas físicas ou de entidades públicas ou privadas, exceto as destinadas a atividades de cunho acadêmico;
- revelar fato ou documento sigiloso de que tenha ciência em razão do cargo; e
- proferir voto, decisão ou despacho estando fora da jurisdição.
O projeto é relatado na Comissão de Constituição e Justiça pelo senador Weverton (PDT-MA), que ainda não apresentou seu parecer. O senador precisa analisar 58 emendas que foram apresentadas ao projeto. Algumas das emendas de senadores da oposição buscam suprimir trechos do projeto.
É o caso de emenda do senador Rogério Marinho (PL-RN), que foi ministro do Desenvolvimento Regional no governo Jair Bolsonaro. Marinho apresentou emenda para suprimir do projeto o trecho que afirma ser crime de responsabilidade do presidente “divulgar, direta ou indiretamente, por qualquer meio, fatos sabidamente inverídicos, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas”.
Para o senador, a tipificação das chamadas “fake news” como um crime de responsabilidade pode, segundo ele, inviabilizar a discussão política de temas relevantes para o País, “além da falta até hoje de parâmetros seguros para a sua devida classificação”. Marinho, em outra emenda, busca fortalecer os parâmetros para garantir aos cidadãos o direito de oferecer denúncia por crime de responsabilidade.
Foram convidados a participar da audiência o ex-ministro do STF, Ricardo Lewandowski, que presidiu a comissão que elaborou o anteprojeto; Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, ex-secretário da Mesa do Senado, atualmente membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Gregório Assagra de Almeida, procurador de Justiça aposentado do Ministério Público do Estado de Minas Gerais e professor da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp); Maurício de Oliveira Campos Júnior, advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG); Heleno Taveira Torres, advogado e professor da Universidade de São Paulo (USP); Pierpaolo Cruz Bottini, advogado e professor da USP; e João Trindade Cavalcante Filho, consultor legislativo do Senado.