Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Saúde

Entrevista

Assintomático, glaucoma é mais agressivo na população negra e pode ser prevenido de forma facilitada

Por Bruno Leite

Assintomático, glaucoma é mais agressivo na população negra e pode ser prevenido de forma facilitada
Foto: Priscila Melo / BN

Estima-se que 1% a 2% da população global viva com o glaucoma nos dias atuais. No caso da população brasileira, a estimativa é de que 900 mil pessoas sejam portadoras da doença. Para conscientizar a sociedade sobre a necessidade de prevenção desta condição, é comemorado nesta sexta-feira (26) o Dia Nacional de Combate ao Glaucoma.

 

Para falar sobre o assunto, o Bahia Notícias convidou a oftalmologista Aline Uzel, da rede pública da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de Salvador. Especialista no assunto, a profissional evidenciou a importância do acompanhamento contínuo e esclareceu quais são os fatores de risco para o desenvolvimento do glaucoma.

 

"Muita gente confunde achando que glaucoma é igual a pressão ocular aumentada, mas a gente tem alguns tipos de glaucoma, inclusive existe o glaucoma de pressão normal, em que a pressão está teoricamente normal, mas pra aquele determinado paciente ela pode estar sendo elevada e danificar o nervo ótico", esclareceu a médica sobre os mitos em torno do problema.

 

Segundo ela, a resolução da questão pode estar a poucos metros de casa, uma vez que os postos de saúde servem como porta de entrada para a realização de consultas preventivas e também do tratamento. "Para ter acesso, o paciente pode ir no posto de saúde e pedir para marcar um oftalmologista. Aí ele é direcionado", exemplificou a entrevistada.

 

Queria que a senhora me dissesse de forma sucinta o que, de fato, é o glaucoma.
O glaucoma é uma neuropatia ótica em que o maior fator de risco é o aumento da pressão intraocular. É uma alteração que dá no nervo e pode levar a cegueira, exatamente pela degeneração das células do nervo ótico. E, como eu disse anteriormente, a pressão intraocular é o maior fator de risco. 

 

Muita gente confunde achando que glaucoma é igual a pressão ocular aumentada, mas a gente tem alguns tipos de glaucoma, inclusive existe o glaucoma de pressão normal, em que a pressão está teoricamente normal, mas pra aquele determinado paciente ela pode estar sendo elevada e danificar o nervo ótico.

 

Qual a incidência do glaucoma na população mundial e na população brasileira? Temos esses dados?
Dados e números talvez eu não consiga te dar agora, mas, para você ter uma noção, é a patologia que é a maior causa de cegueira irreversível do mundo. Na Bahia a gente tem uma peculiaridade: o fato de ser um estado com a raça negra um tanto quanto predominante. E nos negros o glaucoma é muito mais agressivo. Então se não tiver controle, uma boa prevenção, a gente acaba tendo incidência de cegueira muito grande.

 

Existem doenças que atenuam essa condição ou outros fatores de risco?
Existem alguns fatores de risco. A pressão intraocular elevada, como eu falei, é um dos maiores fatores de risco, mas tem ainda o fator raça, a presença da miopia - que apesar de ser um fator de risco menor, é uma predisposição, porque o olho do míope é mais frágil -, o histórico familiar e há também o fator idade, porque existe um risco maior após os 40 anos.

 

Se a senhora pudesse indicar medidas de prevenção, quais seriam?
Vá ao oftalmologista! Parece um jargão, mas é a maneira mais fácil de poder prevenir o glaucoma. Ele não tem cura. É uma doença que tem controle, mas o maior risco é que ela é silenciosa. Então, o olho não dói, o olho não coça, o olho não arde, a pressão começa a aumentar, o paciente não sente e o nervo ótico está sendo danificado. O paciente vai perdendo a visão periférica, inicialmente, por isso que não percebe, vai diminuindo e ele só vai se dar conta quando já está tropeçando e se batendo nas coisas. A consulta regular ao oftalmologista é a maior prevenção que a gente pode fazer ao glaucoma. Porque no consultório a gente vai medir sua pressão, a gente vai ver seu fundo de olho, vai ver seu nervo ótico com detalhes, além de colher toda essa história. 

 

Se tratando de acompanhamento oftalmológico, o que seria uma frequência regular?
Quando o paciente é jovem, até 39 anos, uma vez por ano está tranquilo. Como sou especialista em glaucoma, eu aperto mais um pouquinho e aconselho que, após os quarenta ou se tiver história familiar, faça consulta a cada 6 meses.

 

Os instrumentos de diagnóstico são acessíveis? Existe uma rede específica de atenção ao glaucoma, por exemplo?
Temos uma rede do SUS que dá esse suporte. No estado há o Hospital Roberto Santos, no âmbito federal existe o Hospital das Clínicas e a nível municipal a gente tem alguns postos de saúde com o atendimento oftalmológico, além do Multicentro Carlos Gomes, do Multicentro do Vale das Pedrinhas e várias clínicas parceiras que são credenciadas. Para ter acesso, o paciente pode ir no posto de saúde e pedir para marcar um oftalmologista. Aí ele é direcionado. Além dos que citei, Salvador tem hospitais filantrópicos como o Santa Luzia, o Humberto Castro Lima e o Santa Izabel.

 

Como ele é identificado por profissionais oftalmologistas? Há algum tipo de exame?
Bom, quando a gente chega na consulta básica do oftalmologista, a gente vai ver a visão do paciente e colher a história. A anamnese é uma coisa muito importante pra diagnóstico de qualquer patologia. Depois que a gente faz a parte do ajuste da visão, medimos a pressão dele, já partimos para a primeira parte que nos direciona para o glaucoma, então aí vemos o fundo do olho. Se é um paciente que está com a pressão elevada ou tem o nervo ótico suspeito, encaminhamos para os exames específicos de glaucoma, que são: campo visual, retnografia, paquimetria, OCT, gonioscopia. E tudo isso está disponível na rede pública de saúde. 

 

Recapitulando o que conversamos: para além da diminuição do campo de visão, não há sinais, correto? 
Esses sintomas [da diminuição do campo de visão] só aparecem quando já está muito grave, porque não há sinal algum. O risco do glaucoma levar a cegueira é exatamente o fato dele ser assintomático. Para o paciente chegar nesse ponto, ele tem que ter ficado muito tempo sem ir no oftalmologista. Muitas vezes a gente vê pacientes indo em optometristas, principalmente no interior e em bairros de periferia, com técnicos que não são médicos. [É necessário lembrar que] o exame oftalmológico é um ato médico e esses procedimentos estão sendo realizados de maneira ilegal. Então, o pessoal vai, faz só o exame de óculos, passa na ótica e compra, sem o devido acompanhamento. Com isso ele não está vendo o fundo do olho, acha que está sendo examinado e na verdade não está fazendo um exame correto.


 
Quando diagnosticado, o glaucoma é enquadrado em um tipo, não é?
Vou te falar os mais comuns. O glaucoma crônico de ângulo aberto é o mais comum e o que a gente faz agora a campanha de prevenção de forma ativa. Tem o glaucoma de ângulo estreito, que são aqueles que por ter um ângulo mais estreito, por algum motivo a pupila dilata, fecha o ângulo e tem uma crise aguda de glaucoma. Tem o glaucoma congênito também, que é quando a criança já nasce com. Temos o glaucoma infantil e juvenil, que é quando o paciente, na fase da infância ou na adolescência, vem a desenvolver a doença, mas que não é tão comum. Tem o pigmentar, o secundário, o corticogênico... temos então alguns tipos e o ideal é que a gente verifique mesmo no consultório.

 

Como é feito o tratamento?
Hoje a gente inicia, a depender do paciente, com a aplicação do laser - que tem tido um bom resultado para glaucoma inicial a moderado e hipertensos oculares - e partindo daí a gente vai para o medicamento. Mas, como todo tratamento clínico, se não há uma resposta, passamos para a cirurgia. Dentro da cirurgia a gente tem algumas opções, a exemplo da colocação de dispositivos e da trabeculectomia. Enfim, nós temos uma infinidade de procedimentos que podem dar condições ao paciente.