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Lei Rouanet se mostra ineficiente no estímulo à cultura baiana

Por Lara Maiato

Foto: Reprodução
Na Bahia de Caymmis, Gals, Gils, Caetanos e Tom Zés; de Castro Alves, Jorge Amados e João Ubaldos; de Oloduns e Ilê Ayês; numa terra em que a cultura é tão enraizada, é inacreditável que o investimento na área seja ainda tão restrito.
 
Como o Bahia Notícias divulgou na semana passada, uma pesquisa da Nexo concluiu que apenas 1% da captação de recursos via Lei Rouanet foi destinada à Bahia. Segundo o instituto, uma das causas para essa realidade foi o baixo investimento no estado por parte das principais empresas brasileiras.
 
A Lei Federal de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet, tem como objetivo instituir políticas públicas para incentivar a cultura nacional. Dessa forma, o produtor ou artista deve apresentar projeto cultural no Ministério da Cultura (MinC) junto com o orçamento e, se aprovado pelo Conselho Nacional, obtém uma carta que o permite ir atrás de patrocinadores para conseguir a verba necessária. Em contrapartida, parte do imposto de renda – 6% para as empresas e 4% no caso de pessoa física - é revertido para a cultura. Os maiores entraves, no entanto, não são governo. “A burocracia estatal é a parte mais fácil. Difícil é convencer a empresa a comprar a ideia e investir no projeto. Dos milhares de projetos aprovados pelo MinC anualmente, só 20% consegue patrocinador”, afirma a advogada e atriz Anna Tereza Landgraf ao Bahia Notícias.
 
Para o secretário de Cultura da Bahia, Albino Rubim, o baixo patrocínio por parte das empresas do estado se deve ao fato de “a Lei Rouanet ser um mecanismo de financiamento extremamente concentrador". "Como quem decide em quais projetos investir é a empresa e grande parte das sedes está no Rio de Janeiro e em São Paulo, em torno de 70% e 80% dos investimentos tendem a se concentrar nesses dois estados. Assim, o que sobra para os outros é muito pouco. O número de projetos que a Bahia apresentou e que foram aprovados foi grande, o problema é que não houve a captação depois”, avaliou.
 
De acordo com Marcio Polidoro, diretor de comunicação da Odebrecht, uma das maiores empresas sediadas na Bahia, a instituição acredita que “o incentivo fiscal é um importante estímulo ao apoio cultural no Brasil, mas não deve ser a única maneira desta ação se concretizar". "Ao longo de 2012, em projetos de natureza cultural, ambiental e social, a Odebrecht investiu R$ 108 milhões. O Prêmio Odebrecht de Pesquisa Histórica – Clarival do Prado Valladares, por exemplo, é concedido a projetos selecionados por uma comissão julgadora e cobre todas as despesas do projeto, desde a pesquisa e a edição até sua publicação e evento de lançamento”.
 
Embora acredite que facilite e seja um bom incentivo, o produtor e músico Luisão Pereira garante que na prática a lei tem alguns gargalos e alguns entraves bem complicados. Além da centralização no eixo Sul-Sudeste, “artistas já consagrados tem muito mais facilidade para captar [recursos], para achar um patrocinador, do que um projeto desconhecido – e esse sim precisa muito mais de retorno do Estado pra poder caminhar”, defende o integrante da banda “Dois em Um”.
 
Pela experiência como atriz, Anna Tereza justifica que esse cenário existe porque as empresas enxergam o patrocínio apenas como uma forma de fazer propaganda. “Quando saímos da comédia usual, por exemplo – que diverte, mas pouco acrescenta – e defendemos um projeto que tem uma temática social bacana, sentimos a dificuldade de convencer os possíveis patrocinadores, mesmo usando todo o nosso latim para invocar a responsabilidade social e pontuar o quanto será positivo para a imagem da empresa se aliar a tão nobre projeto”, concluiu. 
 
Para Rubim, no entanto, o grande problema do entrave para o financiamento de projetos pouco conhecidos deve-se à “lógica das empresas para escolher o que elas apoiam ou não". "Não é uma lógica cultural estética, é uma lógica do marketing cultural. Então essa lei traz uma dificuldade muito grande para os artistas que são novos porque se você não tem um nome conhecido, a empresa não tem interesse em associar ou financiar e apoiar essa obra. Ou seja, ela não só é concentradora geograficamente, mas tende sempre a apoiar a cultura já instituída, os artistas já conhecidos”. 

Não há uma questão legal que vete as empresas em investir em produtos e marcas rentáveis ou limite a participação artistas, mas, para Luisão, “cabe aos patrocinadores terem consciência realmente do que é preciso no cenário cultural brasileiro”.

A realidade parece um contrassenso quando se pensa que os artistas que conseguem o patrocínio frente às grandes empresas possuem forte projeção nacional e são capazes de se auto-sustentar. “São coisas que precisam ser revistas e pensadas por todos, porque as empresas quando patrocinam um show de um artista pela Lei Rouanet não estão usando o dinheiro delas, mas da população, um dinheiro que é nosso”, apontou  Luisão. De acordo com o secretário de Cultura, "a Lei Rouanet é muito perversa". "Apenas 5% dos recursos são privados, enquanto 95% são públicos. Então, na verdade, a situação é que se tem uma lei que em vez de incentivar a iniciativa privada para botar dinheiro, ela está fazendo com que o dinheiro público seja decidido pela iniciativa privada, pelas empresas”, detalhou.
 
Há, no entanto, outras possibilidades. Enquanto a Lei Rouanet mobiliza atualmente em torno de R$ 1,8 bilhão, o Fundo Nacional da Cultura (FNC), que é outra forma de investimento do governo federal, mobiliza em torno de R$ 300 milhões. “Temos seis vezes mais dinheiro da Lei de Incentivo à Cultura do que do Fundo de Cultura, que é um aporte direto, ou seja, pode incentivar diretamente um jovem criador cultural porque a relação é outra”, salientou Rubim. Além da Lei Rouanet e do FNC, há também a possibilidade dos produtores e artistas buscarem o financiamento através do governo do Estado. “Na Bahia tem o 'Fazcultura', que se baseia no ICMS, e tem a possibilidade de utilizar R$ 15 milhões por ano”, pontuou o secretário. 

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